Talvez a árvore mais distinta em Israel seja a Tamareira. De porte alto, com uma postura retilínea e uma copa com imensas palmas verdes esta palmeira se destaca não só na paisagem, como na história e economia da Terra Santa e do Oriente Médio. Com isso, não é surpresa que a tâmara não só esteja presente na Bíblia, como também tenha muitos significados.
Conhecida cientificamente pelo nome em latim Phoenix dactylifera, ela é uma das poucas palmeiras nativas desta região, com a maioria das espécies deste grupo crescendo nos trópicos, como no Brasil, por exemplo. Contudo, a sua distribuição atual é muito mais ampla do naturalmente era. E há um motivo para isso. Mais de 6000 anos de cultivo.
Biologia
Natural, segundo os botânicos, de oásis da região do Golfo Pérsico, a tamareira foi uma das primeiras árvores frutíferas, se não a primeira, a ser cultivada pelo Homem. Dessa forma, com o dispersar das comunidades pela região, sementes desta árvore foram se espalhando ocupando uma área atual que vai do Norte da África ao Irã e Iraque, se adaptando melhor em solos com alto teor de salinidade e poucas chuvas.
Contudo, além de seu porte que já se destoa na paisagem, outra característica sua chama a atenção dos Humanos há milênios. A tamareira é dióica, isto é, ela tem árvores fêmeas e árvores machos, com ambas gerando um volumoso cacho com flores durante a primavera que, nas árvores fêmeas, transforma-se num frondoso cacho de frutas.
Etimologia
Outra característica interessante que vale a pena ser mencionada é em relação à origem etimológica tanto so seu nome em português, como do seu nome científico, em latim.
A palavra tâmara tem sua origem de línguas semitas, sendo conhecida como Tamar já na Bíblia. O nome Tamar é usado ainda hoje para a fruta tanto em árabe (التمر), quanto em hebraico (תמר).
Já em relação ao seu nome científico, principalmente do gênero, Phoenix, ele, apesar de ser em latim, faz referencia ao nome das tâmaras em grego arcaico. Já o epiteto, dactylifera, refere-se ao forma de dedo da fruta. Isto é dedo que nutre, dactylo + fero.
Porém, é possível que algo tenha chamado a sua atenção quando você leu o nome do gênero. Phoenix é também o nome da mitológica ave que renasce das cinzas. E o nome em grego da árvore e da ave parece ter conexão.
A tamareira tem a curiosa característica de rebrotar depois de derrubada. Esta propriedade de “renascer”, além de transforma-la em símbolo da imortalidade a muitas culturas locais, pôde também ter contribuido ao nome à ave, que também tem o dom de “renascer”. Ou vice-e-versa.
A Importância Histórica e Econômica da Tâmara no Mundo Antigo
Todos que já tiveram a oportunidade de provar esta fruta doce e carnosa conseguem entender o motivo de sua escolha ao cultivo pelos nossos antepassados, há mais de 6 mil anos. Contudo, desde aquela época, a tamareira fornecia muito mais que uma boa sombra e saborosos frutos.
De seu tronco, mesmo sem corta-lo, pode-se extrair fibras para a confecção de utensílios, como colções, cestas e cordas, além de se extrair um suco – na verdade, a seiva da planta – que se toma puro, ou destilado, e, quando a árvore cai, ou é derrubada, a sua madeira, mesmo que macia, pode ser utilizada à construção.
Apesar de, como qualquer palmeira, a tamareira produzir o palmito, ele é raramente colhido pois, para isso, seria necessário matar a árvore como um todo.
Já as suas longas e fortes folhas, além de ter um valor religioso, como veremos adiante, também eram usadas pra o telhado e produção de materiais, enquanto que as suas frutas, com cores que variam do amarelado ao avermelhado, eram usadas não só para a alimentação, como produção de destilados e de um xarope, também chamado antigamente como mel de tâmara.
Mesopotâmia e Levante
Toda esta versatilidade que a tâmara possui, claro, afetava a história e a economia de onde eram produzidas. Elas, junto as Oliveiras, ajudavam a demarcar as fronteiras geográficas e culturais da região Mediterrânea. Esta distribuição específica, inclusive, influenciou como alguns povos eram conhecidos.
A região da Fenícia, de onde vem os fenícios, com grande relevância bíblica, ganhou este nome dos gregos, exatamente por conta da grande quantidade de tamareiras que eles cultivavam. Não à toa é facil perceber a similaridade nos nomes Fenícia e Phoenix.
Já mais para o interior da região, mais precisamente na Suméria, o povo local tinha mais de 150 palavras relacionadas a esta palmeira. E é desta região, mais especificamente em Ur, que nasce nosso primeiro profeta, Abraão. Ele, como mercador, talvez tenha sido o responsável por trazer as tâmaras a Canaã.
Por estarem naturalmente dispersas próximas a oásis, as tamareiras eram vistas como um sinal dos céus por caravanas que circulavam pelo deserto por dias.
Ainda na região da Suméria, numa das primeiras obras literárias conhecidas da humanidade, A Epopeia de Gilgamés, é possível notar a importância desta fruta na região, sendo esta, talvez, uma das menções escritas mais antigas já encontradas à esta fruta:
E não amastes também Ishullanu, o jardineiro do bosque de palmeiras de vosso pai? Ele vos trazia incontáveis cestas repletas de tâmaras; todos os dias ele cobria vossa mesa. – A Epopeia de Gilgamés
Judeia
Mais especificamente no que tange a região da Judeia, onde encontramos Israel Moderno, a relação com a tamareira é mais do que especial, um exemplo disso é que a região era representada pela palmeira, principalmente em moedas cunhadas na época de Jesus.
Contudo, a relação da Terra Santa com a tâmara é bem mais antiga. A cidade de Jericó, a mais antiga das cidades, por exemplo, é conhecida no Pentateuco como a Cidade das Palmeiras por conta dos tamanhos de suas plantações.
E o sul, e a campina do vale de Jericó, a cidade das palmeiras, até Zoar. Deuteronômio 34:3
Com tanto a geografia, quanto o solo ajudando o desenvolvimento das tamareiras na região, a Judeia foi se tornando um expoente cada vez maior na produção e exportação das tâmaras. Se no início do Século XX Israel era conhecida por suas laranjas, de Aarão a Jesus, eram as tâmaras que tinham o status de estrela.
Curiosamente, as palmeiras da região costeira não eram tão importantes comercialmente quanto as do Deserto da Judeia
E, como vimos anteriormente, tamanha era a fama das tâmaras da região que os arqueólogos encontram ela cunhada em moedas, como a da conquista de Jerusalém por Tito, na qual contava com a face de seu pai, o imperador Vespasiano, num lado e uma tamareira no verso, bem como em outras cunhadas pelos Hashmoneus, durante a Revolta Judaica, e por Herodes Antipas.
Palmetas, um motivo de arte que, na sua expressão mais característica, deriva da folha da palmeira em forma de leque, também são encontrados em grandes números estampados tanto em edificações, quanto em ossuários. Da época de David ao início do Cristianismo.
Contudo, esta grande relação da Judeia com as Tâmaras não era apenas por conta da paisagem e sim, comercial. Os frutos desta palmeira eram um grande trunfo econômico da região por conta de sua exportação à Grécia e à Roma.
O gregro Hipócatres, conhecido como o pai da medicina, já referenciava às tamareiras da Judeia tendo um alto valor medicinal. Isso ajuda a explicar o motivo das tâmaras desta região serem tão mais desejada que as similares colhidas ou no Chirpe, ou Egito.
Um outro exemplo das grandes plantações na época de Jesus no deserto da Judeia, além de Jericó, encontrava-se em Ein Gedi, local bíblico, que contava com a proteção da fortaleza de Massada. Esta continuidade de plantações de tamareiras há mais de mil anos, do Vale ao Rio Jordão, ao oásis de Ein Guedi, impresionava a todos e, por conta disso, era retratada em por escrito também.
Exemplo disso é no livro A Guerra dos Judeus, do históriados judeu-romano Flavius Josephus, no qual ele descreve o Vale do Rio Jordão como um local repleto de palmeiras, de ambos os lados do rio, com as tamareiras de Jericó produzindo um fruto de tal qualidade que o xarope produzido dele poderia ser comparado ao mel da abelha.
A Tâmara na Bíblia, Velho Testamento
Toda essa relevância da tâmara não poderia passar despercebida pela Bíblia. Uma árvore que estava presente tanto no dia a dia de Abrão e David, claro, teria referências no livro sagrado. Contudo, o mais interessante de tudo é que na Bíblia, por muitas vezes, a tamareira e as tâmaras não são somente a representação da árvore. Ela diz muito mais.
Referência Geográfica
A primeira referência bíblica à palmeira utiliza a árvore como referência a um local, o oásis de Elim, quando quando os judeus deixam a escravidão do Egito para entrar no Deserto:
Então vieram a Elim, e havia ali doze fontes de água e setenta palmeiras; e ali se acamparam junto das águas. Êxodo 15:27
Poucos livros depois, em Deuteronômio 34:3, novamente o Pentateuco volta a usar as tamareiras como um atributo de um local, ajudando a identificar Jericó, como vimos anteriormente. Contudo, ao longo dos Livros, esta ideia de se referenciar locais por suas tamareiras mostra que era algo comum na época bíblica.
Estes exemplos podem ser encontrados em locais que apresentam Tamar em seu nome, por exemplo. São os casos de Baal-Tamar (Juízes 20:33), Hazazon-Tamar, atualmente conhecida como Ein Gedi (2 Crônicas 20:2), e Tamar, no sul de Israel Bíblico (Ezequias 47:19 e 48:28). isso tudo, além de Jericó, citada outras duas vezes como a Cidade das Palmeiras (Juízes 1:16; 3:13; 2 Crônicas 28:15).
E por falar em referências geográficas usando a tâmara como parâmetro, uma das mais famosa, talvez seja uma das mais incorretamente interpretadas.
Ouve, pois, ó Israel, e atenta em os guardares, para que bem te suceda, e muito te multipliques, como te disse o Senhor Deus de teus pais, na terra que mana leite e mel. Deuteronômio 6:3
Por mais que possa parecer confuso, para muitos pesquisadores, este mel citado na bíblia, nesta famosa passagem que representa a Terra de Israel, talvez não seja o nosso tradicional mel de abelha e sim um xarope de tâmaras, também conhecido na época como mel de tâmaras.
As evidências para tanto estão, além do grante potencial de Israel a produção deste fruto, como também, pelo de de, por mais que a produção doméstica de mel de abelha fosse conhecida na época do Antigo Testamento e seja, inclusive, mencionada quase 50 vezes na Bíblia Hebraica, abelhas são mencionadas menos de cinco. Isto é, é muito provavel que a produção de mel que a Bíblia se refere não seja a referente ao de abelha.
Não à toa, a tâmara é tida como uma das sete espécies, mesmo não sendo citada nominalmente:
Terra de trigo e cevada, e de vides e figueiras, e romeiras; terra de oliveiras, de azeite e mel. Deuteronômio 8:8
Características físicas e morais
Outro exemplo no qual a tamareira é citada é para definir características de pessoas. Como vimos, seu porte retilíneo e vistoso, além de sua presença junto aos tão importantes oásis, faziam esta árvore e tornar uma grande fonte para metáforas e comparações. Não à toa, em Cânticos, a estatura da mulher é comparada a árvore, que se destaca entre as baixas árvores do deserto,
A tua estatura é semelhante à palmeira; e os teus seios são semelhantes aos cachos de uvas. Cânticos 7:7
Um outro exemplo, em Salmos 92:12, a nobreza desta árvore é relacionada a características morais:
O justo florescerá como a palmeira; crescerá como o cedro no Líbano. Salmos 92:12
Usos na rotina diária e litúrgicas
Como toda a tamareira era utilizada e de maneira bem recorrente pela população, não é surpresa que a bíblia cite algumas dessas formas. O mais interessante, no entanto, é que o fato da apropriação religiosa deles.
O exemplo mais claro deste uso da tamareira encontra-se, primeiro em Levítico e, posteriormente, em Neemias, onde a festa do Tabernáculo – Sucot em hebraico – é referenciada.
E acharam escrito na lei que o Senhor ordenara, pelo ministério de Moisés, que os filhos de Israel habitassem em cabanas, na solenidade da festa, no sétimo mês. Assim publicaram, e fizeram passar pregão por todas as suas cidades, e em Jerusalém, dizendo: Saí ao monte, e trazei ramos de oliveiras, e ramos de zambujeiros, e ramos de murtas, e ramos de palmeiras, e ramos de árvores espessas, para fazer cabanas, como está escrito. Neemias 8:14,15
Nos dias de hoje, além de tradicionalmente os judeus, quando disponível, usam as palmas da tamareira para cobrirem as tradicionais cabanas e, dentro do ritual da festa, rezam com um ramo de palma na mão, conhecida como Lulav, como veremos mais adiante.
Elemento Decorativo
A tamareira era um elemento proeminente na decoração do Templo de Jerusalém. Tanto em 1 Reis 6 quanto em 2 Crônicas 3, e em alguns capítulos de Ezequiel há citações fazendo menção a este elemento decorativo.
E todas as paredes da casa, em redor, lavrou de esculturas e entalhes de querubins, e de palmas, e de flores abertas, por dentro e por fora. 1 Reis 6:29
Desde o chão até acima da entrada estavam feitos os querubins e as palmeiras, como também pela parede do templo. Ezequiel 41:20
E eram representadas em construções, como citado na bíblia e encontrado arqueologicamente, como o capitel proto-eólico encontrado na Cidade de David.
Tâmara (Tamar) como nome
Outra citação bíblica que indica claramente como a tamareira e seu fruto influenciavam a rotina diária dos filhos de Israel se vê no fato de encontrarmos três personagens bíblicos distintos com o nome de Tamar que, como vimos, significa tâmara em hebraico.
O que os estudiosos da Torah dizem sobre este fato é que o nome Tamar era atrelado a mulheres bonitas. Não a toa uma delas era filha de David e outra, sua neta (2 Samuel 13:1 e 2 Samuel 14:27). A terceira Tamar citada na Bíblia está em Gênesis 38:6, sendo a mulher de Er, filho de Judá.
Também nasceram a Absalão três filhos e uma filha, cujo nome era Tamar; e esta era mulher formosa à vista. 2 Samuel 14:27
Outros Exemplos
Além das citações supracitadas, ainda encontramos na Bíblia Habraica outros dois exemplos de citações interessantes
Em Juízes, é dito que a profetiza Débora julgava sob as tamareiras para fazer seus julgamentos.
E Débora, mulher profetisa, mulher de Lapidote, julgava a Israel naquele tempo. Ela assentava-se debaixo das palmeiras de Débora, entre Ramá e Betel, nas montanhas de Efraim; e os filhos de Israel subiam a ela a juízo. Juízes 4:4,5
Porém, talvez a citação maus curiosa seja em Joel. Isso porque ela é a única dentre as tantas referências que temos que, de algum forma, faz menção ao fruto da árvore em si e não a árvore como um todo.
A vide se secou, a figueira se murchou, a romeira também, e a palmeira e a macieira; todas as árvores do campo se secaram, e já não há alegria entre os filhos dos homens. Joel 1:12
A Tâmara na Bíblia, Novo Testamento
Se no Velho Testamento citações à tamareira são frequentes, o mesmo não acontece no Novo. Citações à árvore aparecem apenas duas vezes, ambas fazendo menção as palmas da palmeira.
A primeira delas acontece em João e os seus detalhes influenciam a tradição católica até os dias de hoje.
Tomaram ramos de palmeiras, e saíram-lhe ao encontro, e clamavam: Hosana! Bendito o Rei de Israel que vem em nome do Senhor. João 12:13
Assim como os discípulos de Jesus fizeram há dois mil anos, é normal no Domigo de Ramos ver nos dias de hoje os fieis com ramos de palmeiras em suas mãos.
A segunda citação ocorre em Apocalipse:
Depois destas coisas olhei, e eis aqui uma multidão, a qual ninguém podia contar, de todas as nações, e tribos, e povos, e línguas, que estavam diante do trono, e perante o Cordeiro, trajando vestes brancas e com palmas nas suas mãos. Apocalipse 7:9
Bem como em João 12:13, é possivel notar, novamente, seguidores de Cristo com palmas em suas mãos. Este ato simbólico em alusão à vitória tem um motivo em ambas passagens, como veremos mais adiante.
A Tâmara no Alcorão
O Islamismo é uma religião que surgiu na Árabia, região muito próxima a Israel, no Século VII. Dessa forma, não é de se surpreender, por conta de todos os fatores que ela também fosse influenciada pelo cristianismo, judaismo e, claro, pelo ambiente ao redor, repleto de tamareiras.
Dessa forma, não é de se surpreender que a árvore é citada mais de 20 vezes no Alcorão, o livro sagrado dos muçulmanos. Contudo, se na maioria das citações a árvore é mencionada apenas como que Deus, Alah, criou ao Homem, uma chama a atenção.
Na Surata 19, conhecida como Maria, o Alcorão narra o nascimento de Jesus não numa manjedoura, mas sim sob uma tamareira.
E menciona Maria, no Livro, a qual se separou de sua família, indo para um local que dava para o leste […] Explicou-lhe: Sou tão-somente o mensageiro do teu Senhor, para agraciar-te com um filho imaculado. Disse-lhe: Como poderei ter um filho, se nenhum homem me tocou e jamais deixei de ser casta? […] E quando concebeu, retirou-se, com um rebento a um lugar afastado. As dores do parto a constrangeram a refugiar-se junto a uma tamareira. Disse: Oxalá eu tivesse morrido antes disto, ficando completamente esquecida […] E sacode o tronco da tamareira, de onde cairão sobre ti tâmaras madura e frescas. […] Regressou ao seu povo levando-o (o filho) nos braços. E lhes disseram: Ó Maria, eis que fizeste algo extraordinário! – Surata 19, 16:27
Tradições a cerca da Tâmara para além da Bíblia
Por ser uma árvore que acompanha a humanidade desde o tempo que nós nos assentamos, deixando um pouco a vida nômade de lado e começando com a agricultura, é normal que a tamareira não só, como vimos, fizesse parte da religião, como também da cultura e tradições dos povos e religiões que dividiam a paisagem com esta bela palmeira.
Isso é tão verdade que em inúmeras religiões já extintas a tamareira já estava lá, como no caso dos assírios. A esse povo, também citado na bíblia, a tamareira é identificada como uma árvore sagrada conectada ao Céu por sua copa e a Terra pela base de seu tronco.
A tamareira é tida como um dos mais antigos símbolos representativos da Árvore da Vida, sendo também emblemado triunfo e da vitória.
Ainda na mesopotâmia, esta árvore também era associada a Deusa da fertilidade, Ishtar, o que proporciona, até os dias de hoje, tradições locais ligando a tâmara a fertilidade. Já os Egípcios usavam as palmas no processo funerário como representação da vida eterna, algo similar ao que vimos na relação entre a ave Fênix e a palmeira.
Contudo, a presença das tamareiras nas tradições e lendas não se limitou apenas ao Oriente Médio.
Com a expansão dos impérios Gregos e, posteriormente, Romanos, esta palmeira começou a ganhar espaço nas tradicões locais. Um bom exemplo está no fato da palmeira ser vista como um presságio favorável nas lendas das origens de Roma.
Publius Ovidius Naso, um poeta romano que viveu durante o reinado de César Augusto (63 aC – 14 dC), conta que Rhea Silvia, antes de dar à luz Rômulo e Remo, viu seus futuros filhos em um sonho, na forma de palmeiras com folhas majestosas subindo para o céu.
Judaismo
Como vimos, no judaismo a tâmara está intimamente ligada a ritos religiosos, como na festa de tabernáculo, e sendo uma das sete espécies de Israel. Dessa forma, não é de se surpreender que ela continue presente até os dias de hoje na cultura local.
Em Israel, por exemplo, seguindo o costume bíblico, é muito comum encontrar meninas, mulheres e senhoras com o nome de Tamar, além de, mais recentemente, homens com o nome de Tomer, a versão masculina do nome.
Contudo, é uma vez por ano, não somente em Israel, mas em toda a diáspora judaica, que se pode ver como a tamareira ainda está presente na tradição.
E no primeiro dia tomareis para vós ramos de formosas árvores, ramos de palmeiras, ramos de árvores frondosas, e salgueiros de ribeiras; e vos alegrareis perante o Senhor vosso Deus por sete dias. Levítico 23:40
Seguindo o que foi citado na Bíblia, durante a festa do Tabernáculo, os judeus rezam dentro de suas cabanas – construidas com um telhado feito de palmas de maneira que as estrelas do céu continuem visíveis – com quatro espécies; ramo de salgueiro, ramo de murta, uma cidra e um ramo de palma, que eles chamam de Lulav.
Esta tradição de milênios carrega, claro, grande simbologia, com cada um dos elementos representando um membro da comunidade judaica. O Lulav, no caso, representa o erudito na Tora que não pratica boas ações.
Cristianismo
Dentro do cristianismo, principalmente nos seus primeiros séculos, a tamareira tinha um valor tradicional bem forte ligado a vitória. Contudo, não a uma vitória bélica, como em algumas outras culturas locais, mas sim o triunfo do espírito sobre a corpo. Dessa forma,encontramos em muitas iconografias cristãs antigas a palma como símbolo do martírio, representada junto a santos que foram mortos por professarem sua fé cristã.
Porém, a palmeira como um todo tinha muito mais sentidos na tradição cristã que o martírio. A árvore, em si, ilustrada em adornos de muitas igrejas dos primeiros séculos do cristianismo, simbolizava a retidão que todo o cristão deve senguir no caminho da justiça, além do amor e boas colheitas.
Já nos dias de hoje, ao redor do mundo, é comum ver tanto católicos como ortodoxos empunhando palmas no Domingo de Ramos dando continuidade a tradição que começou com a entrada triunfal de Jesus em Jerusalém.
Uma lenda tradicional do Oriente Médio diz que Maria e José, saíram tão rápido fugindo ao Egito com Jesus que acabaram por não levar mantimentos suficientes. Contudo, quando eles entraram nos pomares de Tamareiras do Egito, uma das árvores se inclinou à família e permitiu que todos se alimentassem do doce e saboroso fruto enquanto os querubins os davam boas-vindas cantando e desejando paz.
Islã
Porém, de todas as religiões monoteista, a que apresenta a maior relação com a tamareira em suas tradições é, sem dúvida, o Islamismo.
Aos muçulmanos, segundo a tradição, Maomé disse que mais do que sagrada, a tamareira fora feita com a poeira remanescente da criação do Homem. Não à toa, ela se assemelha a nós, com “espécimes macho e fêmeas, com fibras, como o cabelo humano e que caso cortem seus brotos, novos não virão, tal qual a mão de um homem que não cresce novamente depois de cortada”. Por isso, a esta árvore, deve se dar o mesmo respeito que se tem pelo “irmão do seu pai”.
O respeito e admiração por esta árvore nas arábias era, e é, tão grande que ela acabou criando o status de Árvore de Vida para alguns e até hoje acreditam que mulheres, mesmo estéries, podem engravidar ao comer do fruto, remontando a conexão da árvore com a fertilidade, como vimos anteriormente.
Uma lenda local diz que um árabe pagão perguntou a Maomé como ele pode ter certeza que ele seria o Profeta de Alá. Maomé respondeu: Eu posso chamar as tâmaras daquela árvore na minha direção. E assim fez. E, após, as mandou retornar ao topo da tamareira. Com isso, o árabe acreditou que Maomé era o Profeta de Alá.
O mais interessante, no entanto, é que a tamareira tem um papel importantíssimo no desenvolvimento da arquitetura das cidades árabes. Isso porque se vemos hoje os altos minaretes que os muezins usam para convocar a população às cinco reza diárias, no início do Islã eles tinham que subir no alto de tamareiras para realizar a convocação. Dessa forma, os minaretes juntos as mesquitas são um fruto direto desta árvore.
Uma tradição muçulmana diz que no fim dos tempos o Domo da Rocha irá se localizar junto a tamareiras e neste local estarão as nascentes dos rios do paraíso.
Já nos dias de hoje, vemos a tamareira presente de diversas formas na cultura árabe. A mais tradicional delas talvez seja através da tâmara, que além de compor pratos típicos, é um alimento tradicional no Iftar – a refeição noturna que põe fim ao jejum diário dos muçulmanos durante o jejeum do Ramadã – bem como o Profeta Maomé fazia.
Já nas artes, tanto pelas restrições iconográficas do Islã, como por ser um símbolo de paz, é comum ver representações da tamareira tanto em tapetes de oração, ilustrações e, inclusive emblemas nacionais, como no caso da Arábia Saudita, berço do Islã.
A Tâmara em Israel do Século XXI
No Israel atual, se há alguma coisa que podemos dizer que realmente se assemelha a época de Cristo são as Tamareiras. Como vimos, por milênios a região da judeia era a principal exportadora do fruto. E hoje não é diferente. Contudo, nem sempre foi assim.
Por quase 1500 anos, a partir de 500 DC, as tamareiras praticamente desapareceram da região. Se hoje, ao passarmos por Jericó vemos, como nos tempos bíblicos, extensas plantações de tamareiras, até o início de 1930 o local não passava de um deserto, no seu sentido mais puro.
O retorno das tâmaras a Israel só se deu graças ao imigrante sionista ucraniano Israel Ben-Zion que contrabandeou do Iraque e adjacências variedades locais de tâmara para ajudar no desenvolvimento da agricultura israelense, quando ainda sob o domínio bretão.
Ben-Zion trouxe as variedades Sair, Khadrawy e Hallawi, porém, hoje, a principal variedade produzida no país é a Medjool, originária do Norte da África e conhecida como a rainha das tâmaras dentre as mais de 200 variedades existentes.
Atualmente, Israel produz 23 mil toneladas de tâmaras Medjook (60% da produção global), fazendo do país o principal produtor mundial desta variedade.
Arqueologia
Como vimos, a tamareira sempre esteve presente não apenas na religião, gastronomia, mas também nas representações artísticas de Israel, inclusive, como citado na bíblia, com representações no Templo de Salomão.
O mais interessante nisso é que desde a década de 60 arqueólogos israelenses vem tendo cada vez mais certeza que o templo poderia, sim, ter elementos que representassem a árvore na sua decoração. Essa conclusão arqueológica se dá pelos achados que começaram com Kathleen Kenyon em Jerusalém ao encontrar capitéis proto-eólicos decorados com motivos de palmeta. Posteriormente, inúmeros capitéis similares foram encontrados ao longo do território dos Reinos de Judá, Israel, Amom e Moabe indicando que este motivo, sim, era muito tradicional.
O mais interessante, no entanto, é que hoje a maioria dos israelenses anda com este símbolo em seus bolsos. Desde 1990 este é o símbolo que ilustra a moeda de cinco shekels que, bem como as demais, apresenta motivos arqueológicos.
Contudo, esta não é a única moeda a fazer referência à tamareira. A moeda de 10 shekels e a antiga moeda, já fora de circulação, de 5 agorot (análogo aos centavos), esta já fora de circulação, também contém a tamareira como um de seus elementos. Enquanto que na primeira há uma tamareira com sete palmas e 13 tâmaras em duas cestas, a segunda, inspirada numa moeda da revolução judaica contra roma, apresenta uma palma entre duas cidras.
Matuzalem, a tamareira do tempo de jesus
Ainda na arqueolgia, por mais que o achado destes capiteis tenha sido de grande importância, talvez, o que o arqueólogo Ehud Netzer tenha encontrado em suas escavações em Massada possa ser uma das descobertas mais interessantes já realizadas e, claro, relacionada com as tâmaras.
Ao escavar a antiga fortaleza judaica construida por Herodes, Netzer e sua equipe encontraram dentro de um caso algumas sementes de tâmaras com mais de 1800 anos! Porém, mais surpreendente do que isso foi que passados 40 anos da descoberta, em 2005, cientistas conseguiram que uma das sementes germinasse!
Dessa forma, mais de mil anos após as tradicionais tamareiras da judeia terem sumido da região, hoje, podemos ter uma clara ideia de como elas se pareciam, porém, não provar as tâmaras.
Isso por que o índivíduo que brotou em 2011 floresceu e indicando a todos que era do gênero masculino e, com isso, recebendo o nome do personagem bíblico Matusalém.
Caso você tenha interesse em ver como era uma tamareira dos tempos de Jesus, ela encontra-se no Kibutz Ketura, no Sul de Israel. Contudo, ao longo de todo o país existem milhares de tamareiras e tantos outros elementos relacionados a esta importante e deliciosa fruta que vão ajudar a você a aprender ainda mais sobre bíblia e história!
Referências:
- Oxford Symposium on Food & Cookery, 1989: Staplefoods : Proceedings
- https://ww2.odu.edu/~lmusselm/plant/bible/palm.php
- http://www.flowersinisrael.com/Phoenixdactylifera_page.htm
- https://biblearchaeology.org/research/conquest-of-canaan/3621-date-palms-not-in-my-back-yard-or-maybe
- The History of the Date through the Ages in the Holy Land – por Asaph Goor em Economic Botany, Vol. 21, No. 4 (Oct. – Dec., 1967), pp. 320-340
- The Date in Jewish, Christian and Islamic Traditions
Em Israel desde 2018, é nativo do Rio de Janeiro. Guia de turismo formado, tenho formação em Biologia e Marketing. Apaixonado por Israel e pela Natureza
Amei descobrir essa historia, muito bem apresentada. parabéns.
amei ler sobre as tâmaras
Muito interessante, me inspirou muito ao ler essa magnífica história. Parabéns e gratidão!
Sensacional obrigada por compartilhar, adorei saber , amo tâmaras, me surpreendeu saber mais da história, texto impecável !!!! PARABÉNS pelo estudo
Muito obrigado pelas palavras, Andréa!
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